sábado, 27 de março de 2010
o estômago se contorcia, dando nós. estava com fome e precisava comer.
por algum motivo sabia que não poderia se saciar com alguma coisa simples.
resolveu caminhar um pouco mais e apostar na paciência que, em geral, não tinha.
minutos depois encontrou o que queria: um lugar que servisse aromas e especiarias.
naquele cardápio diversificado, refinado e um tanto confuso (ali constavam ingredientes desconhecidos para sua limitada cultura gastronômica, com nomes em língua estrageira que ela não entendia), escolheu:
'por favor, um prato de flores.'
a cozinha de lugares como aquele costumam ter um ritmo próprio, sua fome aumentava.
depois de algum tempo, que lhe soou quase como meses, chegou o prato.
ela observou e achou graça, as flores também riam.
comeu, comeu e comeu.
sobrou um pouco. ela guardou no bolso cada uma das flores que ainda estavam ali.
pagou a conta e saiu. deixou-se levar pruma maloca qualquer na beira do rio.
se sentou na parte vazia do deque.
acendeu um cigarro e tirou as flores do bolso. o cuidado com que as guardou impediu que suas pétalas amassassem.
ela costumava ser cuidadosa.
olhou pras flores, pensou em fazer um jardim.
percebeu que algumas delas tinham espinhos - essas ela guardaria pros que pensarem em enganar a flor.
voltou pra casa, que dia vagaroso ...
.:.
quinta-feira, 25 de março de 2010
quarta-feira, 24 de março de 2010
segunda-feira, 22 de março de 2010
sábado, 20 de março de 2010
doce e atroz, mansa e feroz:
mais um pedaço de mim morre. mergulho de novo e não te convido.
.:.
[é preciso educar os ouvidos para ouvir o outro.
e ouvir o outro não é coisa simples, é tarefa de grande monta.
porque o outro fala outra língua que, a princípio, eu nunca entendo.
eu escuto muita coisa. do que eu escuto, alguma parte ouço.
do que ouço, só uma pequena parte sou capaz de entender, não sem algum esforço.
.:.
fale em qualquer língua, estrangeiro! que eu reconstruo seu discurso e arranco seu significado..
só não me venha com uma conversa-fiada, falada em javanês!
olho pra dentro e grito: "ora (direis), ouvir estrelas ..."!
e quanto você? eu já não te ouço mais.]
.
quinta-feira, 18 de março de 2010
terça-feira, 9 de março de 2010
entrou em casa levemente bêbada.
deixou as chaves na estante que estava à direita da porta. foi direto pro banheiro, deixou a bolsa no chão, mijou.
abriu a porta do quarto, tirou os tênis um pouco encardidos, jogou-os indisciplinadamente em algum canto. fuçou no armário e pegou a camisola mais confortável que tinha. logo depois o cobertor.
começou a dispir-se. tirou o jeans surrado, depois a blusa com alguma estampa divertida.
olhou para o seu próprio corpo. pensou que por detrás do piercing, das curvas e da pelugem estavam suas entranhas - algo muito mais íntimo do que a cintura nua. sentiu-se aliviada por não ser capaz de as expor para ninguém.
tirou o top, parou por aí. estar completamente nua era uma sensação estranha.
pensou que nunca esteve completamente nua. queria despir-se de sua própria pele.
de repente sentiu que não conhecia a si mesma. a maior parte do seu corpo, tudo aquilo de íntimo e particular, estava nas entranhas. lugar inacessível para ela mesma.
ela precisava se livrar da epiderme. queria apertar os rins, o intestino, o pâncreas e o fígado entre os dedos, com toda força que tinha.
olhou para os braços, achou graça dos pêlos meio loiros.
olhou para a cintura mal vestida, um pouco de sensualidade residia ali.
voltou a pensar nas entranhas.
pensou nas palavras trocadas, nas palavras não-ditas, na distância que sempre se impunha,
nas expectativas não-logradas, nos gestos mal-pensados, no carinho leviano. a certeza de que estava sozinha, que por muitas vezes se apresentou como alívio, dessa vez apareceu como um nó na garganta.
riu de si mesma e se lembrou de que despir-se daquilo que era não podia ser indolor.
reinventar-se doia. o crescimento do Eu era como uma lança, que lhe cortava a coluna.
abriu o zíper. deixou a pele no chão, como fez com o jeans há minutos atrás.
se surpreendeu quando viu que por baixo da derme não encontrou as entranhas.
olhou para o corpo semi-nu. abriu e fechou os olhos.
fazer-se era tarefa para o tempo todo, para todo o tempo. fazer-se era revolução permanente.
e revolução permanente era politização da vida.
entendeu que o ferro que lhe feria o peito poderia ser um instrumento para se descobrir.
rasgou o tórax, despiu-se de novo.
agora sim estava nua.
deixou as chaves na estante que estava à direita da porta. foi direto pro banheiro, deixou a bolsa no chão, mijou.
abriu a porta do quarto, tirou os tênis um pouco encardidos, jogou-os indisciplinadamente em algum canto. fuçou no armário e pegou a camisola mais confortável que tinha. logo depois o cobertor.
começou a dispir-se. tirou o jeans surrado, depois a blusa com alguma estampa divertida.
olhou para o seu próprio corpo. pensou que por detrás do piercing, das curvas e da pelugem estavam suas entranhas - algo muito mais íntimo do que a cintura nua. sentiu-se aliviada por não ser capaz de as expor para ninguém.
tirou o top, parou por aí. estar completamente nua era uma sensação estranha.
pensou que nunca esteve completamente nua. queria despir-se de sua própria pele.
de repente sentiu que não conhecia a si mesma. a maior parte do seu corpo, tudo aquilo de íntimo e particular, estava nas entranhas. lugar inacessível para ela mesma.
ela precisava se livrar da epiderme. queria apertar os rins, o intestino, o pâncreas e o fígado entre os dedos, com toda força que tinha.
olhou para os braços, achou graça dos pêlos meio loiros.
olhou para a cintura mal vestida, um pouco de sensualidade residia ali.
voltou a pensar nas entranhas.
pensou nas palavras trocadas, nas palavras não-ditas, na distância que sempre se impunha,
nas expectativas não-logradas, nos gestos mal-pensados, no carinho leviano. a certeza de que estava sozinha, que por muitas vezes se apresentou como alívio, dessa vez apareceu como um nó na garganta.
riu de si mesma e se lembrou de que despir-se daquilo que era não podia ser indolor.
reinventar-se doia. o crescimento do Eu era como uma lança, que lhe cortava a coluna.
abriu o zíper. deixou a pele no chão, como fez com o jeans há minutos atrás.
se surpreendeu quando viu que por baixo da derme não encontrou as entranhas.
olhou para o corpo semi-nu. abriu e fechou os olhos.
fazer-se era tarefa para o tempo todo, para todo o tempo. fazer-se era revolução permanente.
e revolução permanente era politização da vida.
entendeu que o ferro que lhe feria o peito poderia ser um instrumento para se descobrir.
rasgou o tórax, despiu-se de novo.
agora sim estava nua.
Assinar:
Postagens (Atom)